eSocial Simplificado: o que fazer com o meu Programa de Ergonomia?
Olá Ergonomista,
Nesse post vamos falar do impacto da publicação eSocial Simplificado (S-1.0) no mercado da Ergonomia e no que a Ergonomia pode ajudar as empresas a cumprir o eSocial.
Governo, entidades representativas profissionais e empresas participaram da criação do novo sistema que está sendo chamado de eSocial Simplificado (S-1.0), lançado em novembro/20 e que entrará em operação em maio/21.
O eSocial Simplificado apresentou redução de mais de 30% dos campos a serem preenchidos pelas empresas.
Segundo o site do eSocial, houve redução de mais de 30% dos campos a serem preenchidos, dentre alguns que foram simplificados e outros excluídos, tais como aconteceu com os riscos ergonômicos.
De fato, desde seu surgimento, esse sistema estava muito inchado, com inúmeros campos desnecessários, o que gerou alguns problemas inclusive. Porém, a partir do seu surgimento e do seu funcionamento, muitas obrigações foram simplificadas e muitas outras vão ser simplificadas, de forma que esse processo provavelmente será contínuo.
Pra começo de conversa, faremos uma breve contextualização sobre o eSocial. Desde 2013 começaram os boatos sobre a informatização de obrigações trabalhistas e previdenciárias e no final de 2014, o governo federal publica o Decreto 8.373 lançando o eSocial. Ele seria um sistema de coleta e cruzamento de informações trabalhistas, previdenciárias e tributárias, para que os órgãos participantes do projeto (tais como Ministério do Trabalho, Previdência Social, Caixa Econômica Federal e outros) pudessem utilizar tais informações para desempenharem cada um o seu papel. De lá pra cá, esse sistema sofreu várias mudanças, umas boas e outras nem tanto, a ponto de muitos interessados tentarem tirar o sistema do ar. Duas coisas principais pesaram para o eSocial não deixar de existir (apesar das inúmeras mudanças):
1) O ganho financeiro que esse sistema geraria pro governo brasileiro;
2) O fato do eSocial não introduzir nenhuma obrigação nova (trabalhista, fiscal ou tributária): ele apenas muda a forma de informar e cumprir essas obrigações já existentes;
Dentro desse histórico, as áreas de saúde do trabalhador, segurança do trabalho e ergonomia (SSE) aumentaram e diminuíram sua presença no sistema por incontáveis vezes.
Foram idas e vindas que fizeram movimentar muito as áreas de SSE, aumentando muito a demanda pelos serviços prestados por empresas e autônomos, dando um verdadeiro "BOOM" de serviços nesses últimos anos.
Muitos profissionais que atuam com Ergonomia foram contratados para “fazer a análise ergonômica para o eSocial”, um termo (e uma coisa) inventada por esse vai e vem de obrigações.
Já em 2019, o Governo Federal havia avisado sobre o processo de simplificação que o eSocial iria sofrer e no final de 2020 em diante, os novos leiautes foram divulgados.
Houve, inclusive, atualização do cronograma de implantação, conforme figura abaixo.
A partir de 2021 começam a entrar as regras da saúde e da segurança.
A atualização do eSocial de novembro/21 apresentou 3 eventos e apenas 6 obrigações de SST remanescentes
Eventos:
1. S-2210
2. S-2220
3. S-2240
4. S-2230 - está relacionado com a área de SST
Obrigações:
1. Aposentadoria especial, PPP e LTCAT
2. Exames médicos do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO)
3. Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT)
4. Insalubridade e periculosidade
5. Tributação de SST (GILRAT, FAP e FAE)
6. Afastamentos, Nexos e Benefícios Previdenciários
Sentiu a falta de alguma coisa?
Os leiautes do eSocial apresentaram inúmeras tabelas de riscos contendo os “Riscos Ergonômicos”, umas com poucos e outras com muitos riscos ergonômicos, ultimamente divididos entre Riscos Biomecânicos, de Mobiliários e Equipamentos, Organizacionais, Ambientais e Psicossociais/Cognitivos. Muitos profissionais utilizam até hoje as tabelas do eSocial (por exemplo a Tabela 23, com os riscos ergonômicos) em muitos serviços, apesar de não terem sido criadas pelo eSocial (a prova disso é a semelhança com a ISO TS 20646, que é de 2017 - “quem veio antes, o ovo ou a galinha?”). Para maiores informações, veja o
post sobre o tema.
A nova versão mais simplificada do eSocial acabou com a tabela de riscos que continham os riscos ergonômicos. A partir da versão simplificada, a Tabela 24 apresenta apenas os “Agentes Nocivos e Atividades”, relacionados à aposentadoria especial.
Dentro desse “vai e vem”, a atuação dos ergonomistas também variou bastante. Houve profissionais que fizeram parte de equipes envolvidas no treinamento das equipes em relação ao eSocial, à implantação do eSocial na empresa, na divisão da empresa em ambientes e setores, na atualização das atividades de trabalho, na elaboração de “análises para o eSocial”, na implantação de melhorias para que os riscos não fossem informados ao eSocial quando entrassem em vigor, dentre outras muitas formas de atuação.
Como o Ergonomista pode atuar agora sobre o eSocial?
- Participação na estipulação dos ambientes, cargos e lista de atividades de cada cargo
- Levantamento dos riscos ergonômicos (seja um levantamento preliminar ou uma AET), os quais farão parte do PCMSO e do programa de gerenciamento de risco ocupacional da empresa.
- Atuação sobre os casos de afastamentos do trabalho
- Atuação na gestão de SAT/FAP
- Atuação sobre os acidentes de trabalho
- Atuação sobre os nexos e benefícios previdenciários
Não é objetivo desse post falar sobre a Ergonomia fora do eSocial, que é infinitamente maior do que a ergonomia indicada pelo eSocial!
Para que uma empresa cumpra com as regras e tenha benefícios financeiros oriundos dos Programas de Ergonomia, ela precisará continuar a entender melhor como as atividades são realizadas, quais as condições de trabalho para tal, identificando as demandas ergonômicas físicas, cognitivas, organizacionais e ambientais dos seus postos de trabalho, bem como algumas características dos seus trabalhadores, para posteriormente criar essas adaptações, tornando os postos de trabalho mais seguras, confortáveis e eficientes.
Paremos para pensar: quantas são as empresas que não possuem nenhum tipo de avaliação das condições ergonômicas dos seus postos de trabalho, quiçá um Programa ou Sistema de Ergonomia implantado?
Esse é um fator importante, pois a obrigatoriedade legal de um Programa Ergonômico se torna uma obrigatoriedade relativa, no momento em que ela só é reconhecida pelos empresários quando a empresa passa por uma fiscalização trabalhista, uma certificação ou por algum problema judicial.
Apesar de não haver a obrigatoriedade do preenchimento dos campos da tabela de riscos ergonômicos, a fiscalização maciça e online do eSocial em relação aos outros eventos e obrigações trará repercussões importantes para a empresa:
> A não identificação dos riscos ergonômicos das atividades de um cargo ou de um ambiente, desfalcará o PCMSO à medida que demandas ergonômicas físicas, cognitivas, organizacionais e ambientais têm grande potencial de gerar problemas de saúde nos trabalhadores, problemas esses que deveriam ser avaliados e controlados pelos exames do PCMSO. Esse vai ser uma grande divergência pois, na prática atual, diversos médicos de trabalho fazem um exame minimalista, incapaz de identificar algum tipo de doença pré-existente. Com o eSocial essa prática está com seus dias contatos. Para maiores detalhes, veja o post “
Ergonomia no eSocial e PCMSO”.
> A dificuldade de alocar no trabalho as pessoas com deficiências e os reabilitados do INSS, à medida que o não conhecimento das exigências ergonômicas de um posto de trabalho, aumenta a chance de falha nessa alocação. Essa dificuldade pode causar, desde o não cumprimento da “Lei de Cotas”, até insatisfação, adoecimento, risco à segurança do trabalhador, bem como perda da produtividade daquele posto. A evolução desses problemas pode causar multas e processos judiciais por tais motivos, o que já tem ocorrido, na prática.
> A falta de adaptação das atividades e condições de trabalho às condições dos trabalhadores causa, certamente, repercussões negativas para a empresa e para os trabalhadores. Esse desacordo de exigências e capacidades causam adoecimentos, principalmente de ordem musculoesqueléticas, psicológicas (mentais e comportamentais). Atualmente estamos em uma identificação crescente de doenças mentais e comportamentais com relação ao trabalho e isso faz crescer, ainda mais, o já enorme número de doenças ocupacionais, sendo que, dentre elas, estão as musculoesqueléticas relacionadas ao trabalho (LER/DORT). Além do sofrimento para o trabalhador, isso reduz a mão de obra ativa dos empresários e aumenta os gastos com novas contratações e com a tributação trabalhista/previdenciária.
> A falta da identificação dos “Input´s”, “Processamentos” e “Output´s” das atividades e processos de um posto de trabalho, impede a análise das operações, aumentando o risco de acidentes de trabalho ou inviabilizando a análise de um evento adverso ocorrido. Essa análise é essencial para eliminar, de forma real, o risco de um novo evento.
> A implementação de um Sistema de Gestão de Ergonomia é o primeiro passo para uma posterior certificação, que um atestado que alguma coisa está em conformidade com alguma regra socialmente estabelecida. Esse processo pretende assegurar o desenvolvimento de padrões que sejam cientificamente confiáveis e reaplicáveis. Ele traz reconhecimento e satisfação dos clientes, melhoria da imagem da empresa, redução de custos operacionais e outros benefícios.
> A não identificação das exigências ergonômicas de um posto é fonte de insatisfação por parte dos funcionários, à medida que alguns podem apresentar dificuldades físicas ou cognitivas durante o trabalho. A exposição de um trabalhador às exigências que estão acima da sua capacidade pode gerar, além de problemas de saúde física, insatisfações com a atividade e baixa eficiência no trabalho. Esse sentimento pode se transformar em um problema de relacionamento interpessoal, atitudes autodestrutivas ou até em uma doença psico-comportamental.
> Um próximo passo possível para os adoecimentos, acidentes e insatisfações é o acionamento da empresa de forma judicial, ou seja, uma reclamação formal pelas vias judiciais, sobre o que o trabalhador julga ser direito e o que lhe foi fornecido pela empresa. Esse, sem dúvida, é um dos pontos mais negativos ocasionados pela falta de um programa de ergonomia e tem grande impacto financeiro nos cofres da empresa, visto que as indenizações podem chegar a casa dos centenas de milhares, em apenas um processo, além de deixar a empresa visada perante o MTE (Ministério do Trabalho e Emprego).
> As repercussões financeiras são, sem dúvida, a principal fonte de atenção por parte dos empresários. Elas aparecem decorrente de pagamento de dias de trabalho por atestados médicos; pagamento de indenizações oriundas de processos judiciais; pagamento de tratamento de casos de adoecimento; pagamento de impostos que são “variáveis” mediante a condição de trabalho da empresa (SAT / FAP); e pela perda da produtividade ocasionada pela ineficiência do processo produtivo.
> Por fim, talvez, em muitos casos, a mais importante situação que repercute negativamente para a empresa é a perda da eficiência na produção. Para muitos, a Ergonomia não teria nada haver com esse tópico, mas esse, sem dúvida, é um dos principais motes da ergonomia. Custos causados por perdas, erros, falhas, retrabalhos e atrasos no processo são descobertos e resolvidos, com protótipos criativos e quase sempre de baixo custo.
Os riscos ergonômicos foram retirados da versão simplificada do eSocial, mas a ergonomia continua firme e forte. Como sempre, programas ergonômicos sucateados e sempre muito básicos, que atendem apenas à lei minimamente, serão alvo de empresas que investirão em Ergonomia, mas não terão o retorno que essa ciência pode fornecer.
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